Caro leitor, vamos fazer um exercício de imaginação juntos?
Topou? Então, tá.
Imagine que você
está com um problema de saúde, leve ou grave, tanto faz.
Imagine que você
vai ao médico e ele te receita um medicamento, e depois vai à farmácia, compra
o remédio (que não sai barato) e o leva para casa.
Chegando lá, vai
tomar o remédio. Olha para a receita, mas ai, a letra do médico é indecifrável.
Você precisa saber quando tomar o remédio, como tomar o remédio. Não lembra
direito do que o médico falou, era muita informação ao mesmo tempo.
Então, ideia
luminosa, lembra da bula. Ah, na bula deve ter tudo explicadinho: como uma
pessoa que tem o seu problema de saúde deve tomar o remédio, de quanto em
quanto tempo, o que esperar em termos de melhora, quais podem ser os efeitos
colaterais e as reações adversas.
Pega a bula. O
remédio e o copo d’água ali, esperando que você descubra se pode mesmo tomar o
medicamento de estômago vazio, se não tem alergia a algum componente da fórmula
e quanto tempo ele demora a começar a agir, entre outras coisas.
E então, caro
leitor, você começa a ler a bula. A informação está toda lá, você sabe disso.
Só que em vez de estar organizada, separada por itens para que você entenda
melhor cada tópico, para que não tenha que ler o que não interessa, para que
não perca tempo lendo o que não é pertinente ao seu caso, tudo é uma confusão
só.
A posologia para
adultos está misturada com a posologia para crianças, as reações adversas estão
misturadas com os efeitos colaterais. A composição embaralhada com a forma de
apresentação do medicamento, que ora se refere a drágeas e ora a comprimidos,
que fala de spray como se fosse de aerossol, que confunde as precauções com as
indicações.
Está tudo lá, mas
agora você já está meio inseguro se esse remédio se aplica mesmo ao seu caso,
se você deve tomar uma ou cinco drágeas (será que drágea é mesmo igual a
comprimido?), se o remédio vai te curar ou te deixar mais doente. Mas o seu
problema de saúde continua e você vai ter que ler a bula toda, com muito
cuidado, até entender como fazer.
Sentiu o drama,
caro leitor?
Agora vamos olhar
para outra coisa, mas com a ideia da bula em mente.
Para o que vamos
olhar? Para um dicionário. Isso mesmo, para um dicionário. E o que tem a ver
uma coisa com a outra?
Quando você lê um
texto ou tem que elaborar um, tem que trabalhar dentro de um determinado
contexto, certo? O contexto é você, o seu corpo.
Quando encontra
alguma palavra que não conhece ou tem que escrever uma palavra, você tem um
problema, não é? Enquanto não resolver esse problema, não vai poder seguir
adiante. Essa é a sua doença, o seu problema de saúde. Enquanto não descobrir o
significado daquela palavra ou como usá-la, não pode prosseguir com o seu
texto. Precisa resolver a questão. E é aí que entra o medicamento: o
dicionário.
A solução está lá,
você aposta nisso. Quando descobrir o que é exatamente e como usar aquela
palavra, seu problema vai estar resolvido e você vai poder continuar a
trabalhar no seu texto.
Aí você pega o
dicionário e abre, na letra da inicial da palavra que está procurando. Mas,
opa, está difícil achar a informação que quer. Você queria saber o registro
daquela palavra? Ou um sinônimo? Ou será que era um exemplo de uso, ou então a
regência? Ou a definição mesmo, a acepção ou acepções daquela palavra. E que
tipo de palavra é? É um substantivo, um adjetivo? E a que campo do conhecimento
humano pertence?
Você sabe que as
informações estão lá. Afinal, é um dicionário, não é?
A esta altura, caro
leitor, você já entendeu que a bula, que serve para que você entenda clara e
rapidamente o que precisa saber sobre o medicamento, corresponde à maneira como
o dicionário é construído, como ele se apresenta, como as informações sobre as
palavras estão organizadas e apresentadas.
Em resumo, as
escolhas lexicográficas que foram adotadas na elaboração daquele dicionário
(que inclui a apresentação e os anexos) vão determinar o grau e a qualidade de
informação que você vai obter a respeito daquela palavra e, consequentemente
usá-la da maneira correta, da mesma maneira que a bula vai orientar como e
quando tomar o remédio, se aquele é o remédio certo e o que pode ou não fazer
enquanto está tomando a medicação.
No próximo post eu vou começar a
comentar as características de uma boa bula, ops, de um bom dicionário.